quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Tensões de Crescimento em Coníferas e Dicotiledôneas

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, abril de 2010

AP 333 – MADEIRA TECNOLOGIA E APLICAÇÕES


PROF. DR. JULIO SORIANO

PROF. DR. RAQUEL GOLÇALVES


TENSÕES DE CRESCIMENTO EM CONÍFERAS E DICOTILEDÔNEAS


Eng. Alan Ricardo Dias


RESUMO : Um dos principais fatores relacionados à depreciação da madeira serrada são as rachaduras e empenamentos que estão associados às tensões internas que se manifestam após a derrubada das árvores, com maior intensidade nas idades mais jovens, diminuindo consideravelmente com o amadurecimento da árvore. No entanto, a indústria madeireira e os pesquisadores ainda não compreendem o seu significado. Este artigo apresentará alguns exemplos de problemas relacionados às tensões de crescimento no corte prematuro de árvores.


1) Introdução :


As tensões de crescimento longitudinais estão presentes em todas as árvores e em toda a madeira que já foi cortada. Na verdade, se não houvesse tensões de crescimento as árvores não conseguiriam manter-se na posição vertical. O mecanismo é apresentado pelas folhosas arbóreas para que permaneçam eretas, apesar da grande esbeltez.

Para manterem a sua verticalidade, as árvores são capazes de “dobrar” ou “compensar” o seu tronco com madeira tensionada (chamada madeira de reação). Nas gimnospermas (softwoods) a madeira do lado inferior do eixo de crescimento está altamente comprimida e é chamada de madeira de compressão (Compression Wood ou CW). Já o contrário acontece nas angiospermas (hardwoods), que a madeira produzida é no lado superior ai eixo de crescimento, chamada de madeira de tensão (Tension Wood ou TW).

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Fig. 1 – Tensões de crescimento em Gimnospermas (Softwoods) e Angiospermas (Hardwoods). CW (Madeira de Compressão); TW (Madeira de Tração); Pith (Eixo de Crescimento) - IAWA Journal, Vol. 22 (3), 2001: 205–212


As tensões de crescimento não são visíveis, embora se possa medi-las.

Quando as árvores são derrubadas e cortadas em tora e as toras são transformadas em madeira beneficiadas, tem-se em cada corte a liberação das tensões de crescimento. Isso torna-se visível na forma de empenamentos, fissuras, rachaduras e fendas. Com isso, o potencial valor econômico da peça se deprecia.

Esta característica é tão comum que as pessoas apenas “aceitam” que a madeira é “assim mesmo” ou que a espécie simplesmente “faz isso”.

As serras de corte são fatores importantes para a liberação das tensões de crescimento. Quando o corte inicia na parte externa do tronco, a tensão externa é liberada e a madeira é “puxada” pra fora. À medida em que o corte se aprofunda, a tensão central da árvore é liberada, fazendo com que a madeira tenha empenamentos.

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Fig. 2 : Tronco de uma conífera totalmente depreciado pela liberação das tensões de crescimento – Cassens & Serrano in Proceedings of the 14th Central Hardwoods Forest Conference


2) Origens das tensões de crescimento :


A primeira tentativa de se explicar as tensões de crescimento foi feita por DINWOODIE, BOYD, CHAFE e CONRADIE (1966) nos Estados Unidos, baseada em estudos feito pelo americano MARTLEY em 1928. Ao observar pranchas de Olmo sendo cortadas, estas apresentavam curvaturas evidentes. Martley considerou que as tensões poderiam ter sido causadas pelo aumento do peso da árvore em um dos lados durante o crescimento. Porém, após alguns cálculos e pesquisas concluiu que o peso das árvores influenciavam muito pouco nas tensões de crescimento.

Segundo CONRADIE (1980), Jacobs (1938) foi o primeiro pesquisador que sugeriu ser a origem das tensões o resultado do possível encurtamento da nova camada de crescimento da madeira, e que esse fenômeno da mudança dimensional ocorre em um

determinado estágio de desenvolvimento da célula.

Em seus estudos, BOYD (1950) concluiu que a lignificação das paredes celulares é a origem primária das tensões de crescimento.

WATANABE (1965), em sua hipótese para explicar o encurtamento das células nas camadas exteriores da árvore considerou que a polimerização da lignina na parede secundária da célula causa o inchaço irreversível da parede celular, tanto no sentido transversal como longitudinal, de acordo com o ângulo da microfibrila nas camadas da parede. Em função disso, postulou que as fibras podem alongar-se ou contrair-se como resultado de lignificação.

BOYD (1972), em seus estudos deduziu que as tensões de substancial magnitude tanto longitudinal, radial e tangencial, são geradas nos tecidos da madeira como um resultado da lignificação das paredes celulares.

JACOBS (1938, 1939 e 1945), estudando o comportamento e distribuição das tensões de crescimento nos troncos das árvores, preparou amostras longitudinais especialmente posicionadas ao longo dos raios, na direção medula-casca, de árvores com vários diâmetros e de várias espécies, onde observou mudanças em extensão e tendências a curvaturas das amostras quando retiradas da prancha diamétrica. De suas

observações concluiu que a madeira próxima à periferia da árvore estava sob tração longitudinal e no centro próximo à medula estava sob compressão.

Segundo JACOBS (1965) e BOYD (1950), a distribuição das tensões longitudinais de crescimento variam de uma tração máxima na periferia até um valor zero por volta de

1/3 do raio, seguindo em compressão crescente até a medula. Como o crescimento em

diâmetro das árvores é formado por novas camadas em diferenciação, surge no xilema, imediatamente logo abaixo do câmbio, a tensão de tração longitudinal de crescimento. A magnitude dessa tensão é considerada baixa, quando analisada a nível de camada individual, mas que se torna máxima na periferia das toras pelo acúmulo das camadas de crescimento no sentido radial. Em virtude do novo xilema se encontrar em contato com o xilema diferenciado mais antigo (maduro), inicia-se progressivamente uma tensão de compressão longitudinal de crescimento no centro da tora, tornando-se máxima na medula, conforme demonstrado na Figura 2 (MALAN, 1984).

Em algumas espécies o aumento do diâmetro e o efeito acumulativo das camadas sucessivas de crescimento em estado de tração induzem aparte central do tronco a uma compressão superior ao seu limite elástico, causando o desenvolvimento de inúmeras fendas de compressão tanto na madeira como nas paredes das células, observadas pela primeira vez na Austrália e denominadas de "brittleheart" (DINWOOOIE, 1966 e MALAN, 1984).

Segundo VAN WYK (1978), as tensões de crescimento ocorrem naturalmente nas árvores antes da derrubada, atuando como uma forma de dar estabilidade à coluna pretensionada.

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Fig. 03 – Madeira de reação em folhosas (esq.) e em coníferas (dir.)


A madeira de reação é geralmente associada à mudança na anatomia das células. A madeira de compressão mostra células mais arredondadas, espaços intracelulares e fissuras nas paredes das células. Já a madeira de tração é caracterizada em algumas espécies pela ocorrência de fibras com uma particular morfologia e composição química devido ao desenvolvimento de uma camada gelatinosa (G-layer). Essa camada é essencialmente composta de celulose cristalizada com um ângulo de microfibrilas muito pequeno (Ruelle, Yamamoto, Thibaut).

As células “normais” da madeira não conseguem suportar as tensões de compressão e tração provocadas por fatores externos como fortes ventos e inclinações de terrenos por muito tempo. Já uma célula com fibras “reforçadas” pode fazer este trabalho. Essa camada gelatinosa de células (G-layer) pode ter Módulo de Elasticidade até 3 vezes maior do que as de célula normal (Okuyama, Yamamoto). Isso nos leva a crer que a madeira de reação se torna mais “elástica” para suportar as altas tensões provocadas no tronco da árvore.

As tensões de crescimento são formadas no câmbio. As fibras, logo após a divisão celular, apresentam uma diminuta contração longitudinal. Essas tensões nas partes mais externas dos fustes fazem o papel de armadura de aço nas colunas de concreto, sendo fundamentais para que os fustes das árvores não se quebrem facilmente quando submetidas a esforços laterais, como os ventos.

Existe uma tendência a se atribuir as tensões de crescimento e suas conseqüências nos eucaliptos em geral, às grandes taxas de crescimento, todavia, não está provado que taxas maiores de crescimento induzem a mais tensão de crescimento. Deve-se entender então que tensão de crescimento não se trata de tensão de velocidade de crescimento.

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Fig. 4 – Madeira de compressão (coníferas) e madeira de tração (folhosas)


3) Desenvolvimento :


As tensões de crescimento ocorrem normalmente em árvores de várias espécies, tanto em coníferas como em folhosas. As folhosas desenvolvem níveis superiores de tensões de crescimento em relação às coníferas. Algumas espécies de folhosas, como o eucalipto, são mais propensas a desenvolver altos níveis de tensões de crescimento. Já se observaram sinais evidentes de tensões de crescimento nas madeiras de mogno (Swietttenia machrophylla), Jatobá (Hymenaea sp.), Andiroba (Carapa guianensis), Cedro (Cedrela sp.), Tatajuba (Bagassa guianensis) e Cupiúba (Goupia glabra).

A mais severa forma de tensão de crescimento é aquela que ocorre na direção longitudinal e na madeira de reação dos troncos inclinados. A distribuição das tensões longitudinais é observada na variação progressiva de forças de tração na periferia do tronco para forças de compressão no centro do tronco. As tensões ocorrem em função de forças internas que se desenvolvem no tronco de árvores vivas, com origem na camada cambial. As células em crescimento tendem a contrair-se na direção da grã e a expandir-se transversalmente, sendo seus movimentos coibidos pelas forças de ligações já existentes entre células anteriormente formadas. Podem ser de tração, ou de compressão, em função da localização dentro do xilema e da direção longitudinal, tangencial ou radial de suas atuações. Pode ocorrer o encurtamento longitudinal da célula em células em processo de diferenciação, o que causa as tensões de crescimento.

O gradiente das forças periféricas e do centro é o principal responsável pelos problemas de rachaduras de topo, em toras recém-abatidas. A liberação das tensões é manifestada imediatamente após a derrubada da árvore e o seccionamento em toras. Na fase de desdobramento e na confecção de toretes podem ocorrer novas rachaduras e empenamentos, como continuidade da liberação das tensões. As árvores com elevadas tensões de crescimento poderão ter a sua situação agravada se estas ficarem expostas diretamente ao sol. As fissuras de topo normalmente ocorrem dentro de uma semana após o abate.

As causas dos elevados níveis de tensões de crescimento ainda não são bem entendidas, embora existam evidências fortes que estejam ligadas ao genótipo, idade, tamanho da tora, taxa de crescimento, idade e inclinação dos troncos. Os seus efeitos também são alterados com práticas silviculturais, condições de crescimento e pelos métodos de exploração. As tensões de crescimento são distintas das tensões e deformações que ocorrem na madeira, como resultado da eliminação da água, através da secagem. A tendência ao rachamento, devido às tensões, varia de acordo com a espécie e entre árvores ou clones de uma mesma espécie. A madeira de Eucalyptus urophylla apresenta grandes variações na intensidade das rachaduras nas extremidades das toras durante o desdobro, onde as variações dentro das progênies se apresentavam maiores que entre progênies.

Algumas considerações sobre o aparecimento de tensões de crescimento em Eucalyptus grandis:

a) o torcimento elevado da madeira está associado à desrama dos ramos vivos;

b) não existe qualquer evidência de que as tensões de crescimento estejam relacionadas com a taxa de crescimento da árvore;

c)os plantios com espaçamentos mais uniformes podem apresentar tensões mais reduzidas, em relação às árvores que crescem em condições naturais;

d) os níveis de tensão se apresentam mais elevados na estação chuvosa;

e) há uma leve tendência de aumento nas tensões em árvores que crescem em terrenos mais acidentados.

Durante o desdobro das toras de eucalipto é comum o aparecimento de empenamentos, como conseqüência das tensões de crescimento. Além das fissuras de topo podem ocorrer um fendilhamento adicional, além do arqueamento, devido às tensões residuais nas toras. Estas distorções se manifestam como torcimento nas tábuas radiais, e encanoamento, nas tábuas tangenciais, face ao desequilíbrio entre as tensões de tração na periferia e compressão no centro da tora . As rachaduras de topo e os empenamentos decorrentes da liberação das tensões comprometem o aproveitamento da madeira, diminuindo o rendimento em madeira serrada e laminada, restringindo o comprimento e a larguras das tábuas e lâminas.

Num curto prazo, não existe uma maneira prática de se eliminar totalmente o problema das tensões de crescimento em toras de eucalipto. O que pode ser feito é minimizar os seus efeitos, através da adoção de alguns procedimentos desde a abate da árvore até o desdobro das toras. As técnicas de atenuação das tensões de crescimento são variadas e já vem sendo utilizadas há algum tempo pelos diversos países produtores de florestas de eucalipto. Quanto maior o tempo de permanência da tora no pátio sem ser desdobrada, piores são as conseqüências das tensões de crescimento. O ideal seria abater a árvore, transportá-la até a serraria e desdobrá-la o mais rapidamente possível.

Pode-se obter ganhos se for possível o transporte da tora em comprimentos maiores e se proceder o seccionamento apenas quando a peça for desdobrada. Se as toras tiverem de ser armazenadas por um curto espaço de tempo, o melhor é fazê-lo nos maiores comprimentos possíveis e efetuar um corte circular parcial nas extremidades até um terço do raio; alguns autores recomendam a aplicação de impermeabilizantes nas extremidades das toras, como a parafina ou mistura de breu e parafina. A técnica do anelamento das árvores é utilizada a uma altura de 20cm do solo ou acima do local de corte, com uma profundidade que deverá variar de um terço até a metade do raio da árvore A técnica de anelamento seja feita no inverno e com antecedência de 6 a 8 meses do abate da árvore. Existem vários inconvenientes para a utilização da técnica de anelamento: riscos de incêndios, ataque de brocas, dificuldades logísticas e nas operações de colheita, transporte e reutilização do terreno. Utilizando-se a técnica de anelamento em Eucalyptus camaldulensis é possível conseguir uma redução de mais de 50% das tensões, mas observou que a técnica não tinha a mesma eficiência para outras espécies.

Em experimento com Eucalyptus grandis, utilizaram-se três sistemas de corte para redução de ocorrência de rachaduras( anelamento circunferencial, chanfro e corte transversal direto) e não observou nenhuma eficácia de qualquer tratamento. As técnicas silviculturais não são efetivas para controlar as tensões de crescimento. Vários pesquisadores utilizaram a técnica de imersão, vaporização e aspersão de água, bem como o uso de desfolhantes em várias espécies de eucaliptos. Podem ser usados, ainda, conectores metálicos, chapas, gang-nails e outros prendedores na forma de S e C, após o corte transversal. Na implantação de novas florestas, o controle das elevadas tensões de crescimento em árvores de eucalipto está diretamente ligado ao melhoramento genético com a seleção de material com níveis mínimos de ocorrência de tensões de crescimento.


4) Conclusões :


De acordo com os textos apresentados em este trabalho, pode-se admitir que as tensões de crescimento são parte de uma estratégia da árvore para competir de uma forma vantajosa com o meio onde está por uma posição privilegiada. Esta estratégia pode-se manifestar de várias formas, como reorientação de sua verticalidade, por exemplo, mas sempre relacionadas com o tipo de distribuição das tensões de crescimento ao longo do perímetro do tronco.

Ainda não se sabe ao certo como e porque são formadas essas camadas gelatinosas (G-layer) nas madeiras de reação, ficando como sugestão para futuros estudos genéticos.


5) Referências Bibliográficas :


Okuyama, Yamamoto, Yoshida, Hattori, Archer (1992) Growth stresses in tension Wood : role of microfibrils and lignifications, ANN SCI FOR 51, pg. 291-300

AGUIAR, JANKOWSKY (1986) Prevenção e controle das rachaduras de topo em tora de Eucalyptus grandis Hill ex Maiden, IPEF, n. 33, pg. 39-46

CASSENS, SERRANO Growth stress in hardwood timber, Proceedings of the 14th central hardwood forest conference, GTR-NE-316, pg. 106-113

VÁSQUEZ (2001) Tensiones de crecimiento en Eucalyptus globules de Galícia (España). Influencia de La silvicultura y estrategias de aserrado, Maderas, Ciencia y Tecnología, 3, pg. 68-89

BAMBER (1987) The origin of growth stresses : a rebutal, IAWA Bulletin n.s., Vol. 8 (I), pg. 80-84

BAMBER (2003) A general theory for the origin of growth stresses in Reaction wood: how trees stay upright, IAWA Journal, Vol. 22 (3), 2001: 205–212

RUELLE, YAMAMOTO, THIBAUT (2007) Growth stresses and cellulose structural parameters in tension and normal wood from three tropical rainforest angiosperm species, BIORESOURCES 2 , pg. 235-251

PONCE, Madeira serrada de eucalipto : desafios e perspectivas, Seminário internacional de utilização da madeira de eucalipto para serraria, pg. 50-58

Portal REMADE (www.remade.com.br)

3 comentários:

Unknown disse...

Sou estudante de Arquitetura 4ªFase, e posso dizer que esse blog foi uma mão na roda no meu trabalho de SISTEMAS ESTRUTURAIS I.
vou passa ele pra turma toda!!

vlww
Daniel

Unknown disse...

Sou estudante de Arquitetura 4ªFase, e posso dizer que esse blog foi uma mão na roda no meu trabalho de SISTEMAS ESTRUTURAIS I.
vou passa ele pra turma toda!!

vlww
Daniel

Anônimo disse...

Pesquise um pouco mais sobre essa camada gelatinosa, já se sabe muito sobre ela sim.